O leilão da Ferrovia Norte-Sul não será tão badalado quanto o processo que concedeu 12 aeroportos brasileiros. O Valor apurou que somente dois grupos compareceram à sede da B3, em São Paulo, para entregar as propostas: Rumo Logística, braço da Cosan, e VLI, que tem como acionistas Vale, Mitsui, Brookfield e FI-FGTS.
Segundo uma fonte envolvida na licitação, por não ter muita concorrência, o ágio na outorga não será tão expressivo. O valor mínimo é de R$ 1,4 bilhão. “É um ativo em que a alocação de risco é alta. As empresas farão suas propostas, mas não farão loucuras. Serão mais conservadoras”, disse.
O trecho que será concedido na quinta-feira, 28, tem 1,53 mil quilômetros de extensão e demandará R$ 2,8 bilhões de investimentos para a sua operação. “O marco regulatório é ruim e isso não atraiu outros investidores. O governo construir toda a ferrovia e depois conceder, com todo o histórico de corrupção em obras de infraestrutura, não é um atrativo. Além disso, o ganhador terá que fazer um raio-X no trecho para ver se há algum erro no projeto e informar ao governo em seis meses. Se isso não ocorrer, ele herda todos os problemas”, afirmou a fonte.
Apesar de todos os problemas do edital, VLI e Rumo têm interesse no ativo por uma questão mais “defensiva” e menos pela qualidade da ferrovia, disse outra fonte também envolvida com o leilão. “Apesar de ter sido comunicado dos problemas da alocação de capital por meio dos pedidos de esclarecimento, o governo ignorou os pleitos e manteve uma alocação de risco absolutamente irracional”, afirmou a fonte, completando que, como ambas as empresas operam as pontas do trecho que será licitado, são ” obrigadas” a participar da disputa. “O fato é que aquela que vencer terá feito um ótimo negócio.”
Para a VLI, por exemplo, é importante arrematar a concessão pois haverá um terminal de armazenamento de cargas no sul de Goiás que pode tirar carga da Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), que pertence à companhia. “Isso justifica uma postura mais defensiva da VLI, que também deve ver valor em explorar o atendimento da carga no sul de Goiás”, disse David Goldberg, sócio da consultoria Terrafirma.
Além disso, a vitória nessa disputa pode ajudar futuramente as empresas a se posicionarem em uma eventual licitação futura da Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico), disse Goldberg.
Segundo outro especialista que chegou a avaliar edital, considerando o modelo econômico e as respostas da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) aos questionamentos apresentados por investidores, somente VLI e Rumo têm condições de disputar a ferrovia, “dada a necessidade de conhecer bem a demanda e de encarar o risco do direito de passagem”. Daqui um ano, afirmou, vai ser interessante observar pedido de reequilíbrio econômico-financeiro devido aos “vícios ocultos” da concessão permitidos no edital.
“O edital é pouco amigável para o investidor”, disse Goldberg. Para ele, os esclarecimentos prestados pela ANTT aumentaram as incertezas sobre quais riscos e passivos serão, de fato, arcados pelo novo concessionário.
Paulo Resende, coordenador do Núcleo de Infraestrutura da Fundação Dom Cabral (FDC), também acredita que o marco regulatório ruim foi um fator preponderante para afastar outros interessados na ferrovia. “A Norte-Sul não é brinquedo para criança. Quem ganhar tem que ter a consciência de que há grandes desafios na operação. É uma ferrovia que tem, em sua área de atuação, multicargas. Isso também não atrai investidores, ter que competir com essas duas é difícil.”
Para os usuários, a baixa concorrência no leilão pode significar fretes menos competitivos. Luís Baldez, presidente da Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Carga (Anut), disse que a “surpresa” seria se mais de dois grupos se interessassem pela Ferrovia Norte-Sul. “A forma como foi feito o edital já se previa que apenas Rumo e VLI apresentassem propostas. E digo mais, a VLI será a vencedora.” Segundo ele, a operação imediata do trecho concedido poderá acontecer somente com a VLI, pois já estão interligados. “A Rumo teria que fazer um investimento maior que o previsto
Fonte: Valor Econômico
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